quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Um presente pro meu presente!


Quando o produzia dentro de mim, lia relatos de partos em que as mamães diziam “foi amor a primeira vista!” e esperava, ansiosa, sua chegada! 

No dia e hora marcados – sim, você foi pontual, por incrível que pareça! Hahá! – lá estava meu garoto, grande, lindo! Fiquei olhando pra você, esperando os sinos tocarem dentro do meu coração, mas nada. Não sentia qualquer coisa que se assemelhasse a aquilo descrito como amor a primeira vista, tão relatado. Haveria algo de errado comigo?

As enfermeiras deram o primeiro banho e o colocaram no meu peito. Você sugou, com força e deleite. As mãos tão pequenas, os olhinhos puxados.

Na primeira noite, você acordava e eu o acolhia. Não sei exatamente quem estava mais assustado, eu ou você. Acontece que, daquele momento em diante, não bastasse eu tê-lo, literalmente, feito, agora o sustentava por um produto meu, o leite. A dependência era tanta, que os limites de nossos corpos pareciam se cnfundir, mesmo depois da segregação. 

E o alimentar, o limpar, o acariciar foi trazendo um sentimento diferente de absolutamente tudo que eu conhecia. Até então, eu imaginava que essa dependência significava que você precisaria de mim, também, para aprender o mundo. Grande inocência, a minha! Você, me dando a primeira lição.

Em 2008, chegou um loirinho magrelo buscando um espaço na nossa casa. Foram dias difíceis. Chorei muito, porque ele não me aceitava como mãe, não nos aceitava como família. Era complexo demais pra ele, mergulhado em sua própria realidade. Era complexo demais pra mim, mergulhada em minha própria insignificância. Foi então que, no segundo dia, desisti.

Não mais suportava o desprezo. Não mais suportava o desespero. Não mais suportava a derrota, minha realidade, minha pequenez, minha incapacidade, minha fraqueza. O loirinho iria para outro canto, não para o nosso.

Entrei no carro, decidida a não mais voltar. Você ficou quietinho, no banco traseiro, me vendo chorar. Parecia preocupado comigo, mas não. Do seu jeito lindo, com sua vozinha abençoada, disse: “Mamãe, cadê meu irmãozinho? Côitadinho! Ele tá lá, sózinho! Vamo lá buxcá meu irmãozinho!” Olhei pra você e percebi que, enquanto eu me lamentava, enquanto eu pensava na desistência, enquanto eu me encolhia, você já havia resolvido as nossas vidas. Você foi o primeiro a adotar seu irmão.

Depois disso, compreendi que o aprendiz, na história, era, sempre fui e sempre serei eu.
Você, meu pequeno grande homem, não tem ideia de minhas lutas internas, de meus pensamentos, anseios, meus pesadelos. Não tem ideia dos meus sentimentos, dúvidas e angústias... muitos deles fundados em você, em vocês! “Só coisa ruim!”, há de pensar o desatento. Na verdade, só luz.

É no questionamento que encontramos a resposta. É na dor que encontramos o alívio. É na dúvida que encontramos a certeza.

É pelos meus três tesouros que todas, absolutamente todas as minhas dores, feridas, suores e lágrimas, sejam elas reais ou imaginárias, são doces, são flores, são mar, brisa e ar. E graças, especificamente, a você, são sóis. 

Obrigada por me ensinar tanto, por me aceitar como aprendiz, por me tornar produto seu. 
(frô - mamãe)

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