[Sonho]
Eu vomitei um astrolábio.
Nas palmas de minhas mãos,
Imenso, reluzente, ele jazia.
Não sei o que tramava,
Indigesto, inútil,
Dentro de mim.
Era grito pras entranhas surdas,
Verso pras analfabetas sensações,
Seta pros meus órgãos cegos,
Conversa pro meu sangue mudo.
E eu, privada dos sentidos,
afogada em incertezas,
Persistindo na decisão tomada
Tomando goles e mais goles de amarguezas.
Tomada pela certeza fria
Do erro que me entorpecia,
Ruminando e me acostumando
Feito gado no pasto;
Aguardando, sem saber, sabendo,
Acovardada, acomodada, amedrontada,
Uma felicidade que viria
Mal eu sabia, só com o pó.
Mas aqui dentro?
Por que foi que engoli essa porcaria?
Quando? Como?
De que é que eu fugia?
Recebi esse astrolábio justamente
Pra evitar a perda de tempo
Nas idéias erradas da vida
Nas flores belas fingidas
Nos casebres charmosamente sem teto.
Ele vinha pra lembrar
Que onde não florescer,
Não se deve quedar.
Coração é iletrado, não tem nada
Que ver com astrolábio.
Coração canta, mas tem que cantar baixinho
Pra não atrapalhar o que se tem que pensar.
Agora, em minhas mãos, retomo a trilha
Tomo garrafadas de persistência,
Coragem e paciência
Pra não desistir no caminho
Até lugares onde eu possa sentir
Onde não precise insistir
Onde simplesmente
Eu mesma seja lar.
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