segunda-feira, 22 de março de 2010

Transeunte


Nada de longas conversas, discutir relação, dar opinião. Nada de dar
explicações nem sequer procurar razões. Não era pra ser assim e assim não seria.
Não existia bem o que se poderia chamar de relação. Talvez um dividir o mesmo ambiente espiritual, o que independe de tempo e espaço. Era tudo o que os unia.

Uma relação tão sutil que sequer existia, mas bem ali, no meio do peito, José sabia que alguma coisa, fosse o que fosse, ocupava lugar.
E era tanto, que as vezes, essa coisa indescrita se tornava tão indigesta que se de fato fosse coisa,
travaria sua garganta, estancando a respiração.

A sutileza relativa do quase relacionamento impregnava os sentidos de José, que entendia, porém sem compreender, que se tratava de coisa séria. Talvez uma coisa além mar, além céu, além vida.

Ana sentia suas asas batendo dentro das costas. Queria rasgar sua pele para poder se ver livre daquele ambiente espiritual que tanto excitava sua alma, que tanto a incomodava. E incomodava porquê não acreditava nessas coisas. E se acreditava, não admitia. Permanecia inerte, como mais um normal.
Nessa quase-história toda, que na verdade era muito mais que uma história inteira, já que era uma singela parte de uma história sem fim, mesmo sem crer e sem querer, Ana se via ao lado de José.

As mãos eram descansadas umas nas outras. Um peito era acolhido pelo outro. Os olhares se acatavam mutuamente. Mas nada daquilo existia. Então. Ainda.

A realeza daquele momento se findava na realidade.

E Ana virou as costas. E José, vendo suas asas a tomarem espaço no mundo, despediu-se de Ana. Lágrimas não rolaram. Sorrisos também não. Apenas um “até logo”, dito sem palavras. Apenas um aperto na alma, que pedia paciência. A Transeunte virou a esquina, sentindo que precisava voar. Não quis olhar para trás. Não podia. Paciência. Até (de)mais.

2 comentários:

  1. muito legal !] celaví!! intensidade sutil , caminhar para poder voar!

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  2. Belo!
    Singelo nas imagens.
    Intenso na paisagem que sinto dentro do caos em mim.
    Em Ana, é calma.

    E se eu te morrer.

    http://shalauniversoparalelo.blogspot.com/2010/03/e-se-eu-te-morrer.html

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